"Destranscendentalizando o materialismo prático-normativo de Marx"
(Terça, 11-12, às 11h30 - Auditório 02 do PASL)

Resumo:

Chamo de ponto-de-vista materialista prático-normativo, transcendental, aquele ao fundo tanto da concepção histórica como da crítica da economia política de Marx, aquele que Marx deixa ver ou entrever primeiro nas Teses ad Feuerbach (de forma direta mas muito condensada) e na Ideologia Alemã (na primeira seção), bem como no Manifesto Comunista e, de forma acabada mas um tanto velada, nos Grundrisse e no Capital. Trato de mostrar que tal materialismo guarda pontos de contato com o pragmatismo, inclusive o dos nossos dias, tanto quanto diferenças essenciais, que constituiriam justamente seu viés transcendentalizante. Com efeito, o materialismo prático-histórico de Marx pode ser lido como compreendendo seis momentos que se interpenetram e articulam: 1) uma recusa do “empirismo dogmático”, “positivista”, intuicionista-passivo, mentalista-cartesiano, bem como do idealismo subjetivista; 2) uma superação da concepção do mundo e do sujeito como estáticos, exteriores um ao outro, e, logo, possivelmente, o abandono do ponto-de-vista do “espectador” e de fixação objetivista-representacionista do real; 3) uma desqualificação do indivíduo “abstrato” da percepção empirista britânica como “robinsonada”: a ficção do indivíduo como dissociado – descontextualizado - do “conjunto das relações sociais” e de uma “forma de vida social determinada” ou “modo de vida” (Lebensweise); 4) uma crítica do real social como essencialmente cindido, hierarquizado e atomizado pelas “más” relações e práticas sociais imperantes (em que os homens se põem ou são postos), que acarretariam o desdobramento/duplicação do mundo também no plano do conhecimento e do pensamento, na religião e na filosofia; 5) crítica essa sustentada pela dedução/construção de um fundamento forte, de fundo, intramundano mas essencializado, que determina, por necessidade, o rumo da supressão prática da contradição e a restauração (reconciliação) da unidade-solidariedade social “perdida”, com o fim da “autoalienação do homem” - para além do ponto-de-vista da Sociedade Civil Burguesa, de hoje, rumo à Sociedade Humana, Comunista, de amanhã, pela necessidade (lei) e pelo “imperativo categórico” de sua realização. Tudo isso atravessado por 6) um desafio, digamos, de “epistemologia política”, de congruência de pontos-de-vista “epistemológicos”, sobre conhecimento e desconhecimento, com posições na sociedade, com que Marx pretende refutar o ponto-de-vista liberal e sustentar seu ponto-de-vista comunista. O que nos enseja perguntar, alternativamente, por um ponto-de-vista “epistemológico” destranscendentalizado, democrático. Fazemos isso, de um lado, em relação crítica com Marx, questionando os elementos de seu remanescente subjetivismo, mentalista-solipisista, representacionista (materialista burguês, séc. XVIII, se se quiser), subjetivismo esse magnificado (numa hipertrofia da figura do sujeito metafísico) com recurso às categorias do idealismo alemão - elementos esse que merecem ser flexibilizados. E, de outro lado, em diálogo com o debate filosófico contemporâneo, e agora numa relação positiva com Marx, isto é, com o lado prático não transcendentalizante nem essencialista de seu materialismo normativo, procedendo a uma derivação pragmatista-histórica que se afaste da quase redução – de parte da filosofia contemporânea - da ação humana (relevante) à prática linguística, e de contexto a linguagem, com consequências quer “formalistas”, quer “relativistas” e “anti-realistas”, para as quais a remissão a noções como formas de vida, mundo da vida, cultura, contexto, etc., por si sós, tem resultado ser uma débil complementação.

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