ANPOF 2010: Autoconsciência e Liberdade na Filosofia de Bruno Bauer



Em uma publicação de 1841 intitulada A Trombeta do Juízo Final contra Hegel Ateu e Anticristo: um utimato, Bruno Bauer afirma o Universal como essência da autoconsciência (Selbstbewusstsein). Esse filósofo possuído por “um amor de extremos”, como o define Arnold Ruge, é talvez o mais hegeliano dentre seus companheiros da Esquerda Hegeliana, inclusive na medida em que se opõe a Hegel. Este último trata a autoconsciência como uma “importante figura fenomenológica e histórica”, pois é momento de Deus e, portanto, momento do Universal/Absoluto. Para o seu jovem aluno, porém, a autoconsciência assume um papel central na filosofia, não só como um momento, mas como qualquer coisa que tenha uma consciência própria que se universaliza, sem perder suas características originais. É a autonomia e o auto-cultivo do sujeito que se opõe às simples particularidades em favor da universalidade como própria essência. O universal transcendente, imperativo, como um telos natural, do modo que pode ser lido em Hegel, é criticado por Bauer por envolver “uma nova forma de heteronomia sobre as ações do sujeito”. Ao invés disso, para esse jovem hegeliano, Autoconsciência (Selbstbewusstsein) é Liberdade (Freiheit), é atividade de indivíduos autônomos e criativos; é auto-construção, porém, imbuída de potencialidades genéricas. A história é, portanto, o espírito finito tomando consciência de sua liberdade , tornando-se infinita autoconsciência. Assim, Bauer termina estendendo, indiretamente, a sua crítica não só à “consciência sagrada” da Idéia Absoluta, de Hegel, como também à “consciência sagrada” de uma classe, como em Marx, ou de um particular, como em Stirner, sendo, por isso, alvo de diversas críticas dos dois últimos. Nesta comunicação, portanto, situo a importância da Autoconsciência e, por conseqüência, da Liberdade na obra de juventude deste importante partidário do grupo intelectual berlinense Die Freien (“Os Livres”), assim como a relação entre esses dois importantes conceitos, não só do seu texto, como de todo debate jovem hegeliano. A partir dessa localização da originalidade da filosofia de Bauer dentro da esquerda hegeliana, desenvolvo também sua política. A idéia baueriana de autoconsciência livre, e não uma parte de um universal transcendente, desenvolve-se de uma leitura hegeliana principalmente dialética, direcionada ao movimento histórico, à mudança, e, portanto, à revolução, tal como foi a leitura sobre Hegel que diferenciou o movimento jovem hegeliano, como coloca Engels em Ludwig Feuerbach e o fim da filosofia clássica alemã (1886). A revolução baueriana, no entanto, se estabeleceria no momento de universalização da autoconsciência, num tipo de organização onde os indivíduos se generalizam sem dissolverem-se (por exemplo, em determinada classe); uma sociedade que se governa sobre a universalidade de sujeitos autônomos, o que expõe seu republicanismo.

Série ANPOF 2010


Após um período de atividades reduzidas, a página do Grupo Poética Pragmática volta à ativa, postando aqui os resumos dos trabalhos enviados pelos membros do nosso grupo para apresentação no XIV Encontro Nacional de Filosofia da ANPOF. O encontro será realizado este ano em Águas de Lindóia - SP, no período de 04 a 08 de outubro.
"Tradicionalmente a ANPOF realiza, a cada dois anos, Encontros Nacionais de Filosofia reunindo os mais expressivos pesquisadores em Filosofia de todo o país e, nos últimos anos, tem contado também com a participação de professores e pesquisadores estrangeiros."

Mais informações: www.anpof.org.br

A relação entre conhecimento e linguagem a partir de uma concepção pragmatista de ambos


A relação entre nosso conhecimento do mundo e as frases através das quais tal conhecimento é transmitido é explicita: não podemos pensar, ou pelo menos transmitir o conteúdo de nossos pensamentos, senão através de palavras. Todavia, durante muito tempo acreditou-se que as frases através das quais tal conhecimento era expresso destinavam-se a fornecer um reflexo acurado do mundo, uma representação correta deste. Segundo esse ponto de vista o conhecimento era algo como uma imagem mental correta do mundo, a qual a linguagem poderia transmitir de forma apropriada ou não. Essa concepção trazia consigo a consequência de que o conhecimento não possuiria uma relação necessária com nossas ações. Um determinado conhecimento poderia não possuir nenhuma implicação prática e a verdade não possuiria uma relação intrínseca com sua utilidade, sendo ele uma mera constatação de como as coisas são. Mais do que isso, a atividade especulativa deveria ser concebida com uma forma totalmente impessoal e contemplativa de ação. A concepção mentalista do significado, desenvolvida por filósofos como René Descartes, parte de pressupostos como o de que nossas relações com o mundo são, sobretudo relações de representação. Também é um pressuposto central a tal concepção o de que o conhecimento, entendido como uma apreensão verdadeira do mundo, constitui-se como uma atividade central e privilegiada do ser humano. O conhecimento assim compreendido, teria na linguagem seu veículo, não chegando ao entanto a identificar-se totalmente com esta. Em síntese: ao menos em tese poderiam existir verdades que a linguagem não poderia transmitir. Aceitando esses pressupostos poderíamos chegar a um ponto, como realmente chegaram filósofos como Schopenhauer, em que a verdade sobre o mundo poderia nos reduzir a mais absoluta Também poderia ocorrer que devido à relação contingente entre verdade e utilidade resolvêssemos abrir mão de justificar nossas afirmações de cunho ético, o que levaria esvaziar a razão de seu potencial prático.
A concepção pragmatista de verdade propõe-se a resignificar as pretensões de universalidade da filosofia de viés mentalista e correspondentista ao mesmo tempo em que naturaliza nossa compreensão da relação entre linguagem e conhecimento. Tal concepção esquiva-se a questionamentos essencialistas que pressupõem que a verdade de uma sentença é a sua correspondência ao modo como as coisas realmente são. No lugar de tal pressuposição o pragmatismo coloca a de que “O verdadeiro é apenas aquilo que se mostra bom no sentido da crença”, conforme Wiliam James o expressou. A concepção pragmatista de conhecimento também se propõe a substituir as relações de representação entre os Homens e o mundo por relações causais, o que teria profundas consequências no campo ético e epistemológico. Para o pragmatismo a relação entre nosso conhecimento do mundo e nossa linguagem é quase de identidade, apenas o que podemos expressar sobre o mundo constitui o seu conteúdo verdadeiro. O mundo, no entanto, permanece existindo para além das nossas frases sobre ele, contudo não há nada que se possa dizer disto.
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