Tiago Medeiros

Em linhas
gerais, Unger defende uma posição teórica que se centra no descongelamento das formas
de vida na cultura, pela ação política sobre o conteúdo das instituições. Entende que as
organizações e crenças que formam os indivíduos são por eles constantemente
postas em cheque no curso de suas vidas, e, portanto, que a vocação
autotransformadora dos sujeitos deve ser o leitmotiv da ação política - depositando
sobre as instituições o espírito de inovação que alterará a vida pública dos indivíduos e garantirá oportunidades para a maior parte das pessoas. Essa linha de
pensamento, que o autor garante ser de esquerda (embora não marxista), é pouco
compreendida entre muitos intelectuais e jornalistas (sobretudo, no Brasil,
onde seu sotaque estrangeirado pesa muito mais do que a originalidade de suas ideias), o que
justifica o perfil das perguntas feitas no debate.
Sobre a
política americana, Unger acredita que
o presidente Obama deve ser derrotado nas próximas eleições sob pena de não se
oportunizar uma reestruturação do Partido Democrata. Obama, a
seu ver, não conduziu o país corretamente em face das transformações que a crise econômica despontou, deixando de alargar as oportunidades para a maioria trabalhadora. Sua gestão, pensa Unger - que, como todos sabem, já foi professor do atual presidente americano (numa disciplina de título Democracy realized) - oscilou no interior de iniciativas que nada difere das do partido republicano.
No Brasil, Unger entende que não houve, ainda, a definição de um projeto que
reorganize o estado e as instituições. Por isso, a seu ver, é preciso um choque de novas
ideias, considerando, ademais, que maior oposição partidária do país – PT e PSDB – reside,
na verdade, na coparticipação de um mesmo ideário, cujo conteúdo é a atenuação
dos resíduos de uma economia de mercado não regulada sobre as camadas não
endinheiradas da população, por meio de políticas sociais de redistribuição
compensatória. A esse ideário partilhado por tucanos e petistas, o autor denomina
Suécia Tropical.
Tocando no
tema de sua participação como Ministro de Assuntos Estratégicos, apresentou a
construção de seu projeto para as três regiões não contempladas historicamente
pela união: Nordeste, Centro-Oeste e Norte, para as quais um conjunto de ações
no campo da educação e das relação entre trabalho e capital haviam sido
formuladas e boa parte executadas. A respeito do primeiro campo, defende a
substituição de um paradigma pedagógico enciclopédico para um ensino analítico
e capacitador que se aplique com vigor na escola média. Sobre o segundo campo,
Unger costuma defender para o Brasil e para o mundo uma inovação institucional
da economia de mercado que a democratize, proporcionando, conquanto, o
aprofundamento da própria democracia, através de iniciativas que canalizem a
poupança para a produção.
O autor tem
grande lucidez acerca do impacto de ideias sobre as práticas na cultura. O
modelo de pensamento que chama de social democrata, que se autoproclama
realista, e contra o qual o declara guerra, é o responsável pela ineficiência
da ação política em diversos terrenos. Unger exemplifica com a política
industrial. A ação do Estado é comumente a de promover fusões entre grandes
empresas, com o dinheiro arrecadado pelo contribuinte, sob o pretexto de
torna-las campeãs mundiais – esperando que a geração de empregos seja a
contraparte social para as massas. A implicação disso, continua o exemplo, é
que os oligopólios financiados pelo estado degolam os pequenos e médios empreendedores
cuja vocação econômica Unger qualifica por energética, para os quais uma ação
de instrumentalização do estado seria a verdadeira política industrial. Há no Brasil
uma massa de pequenos empreendedores em todas as regiões que é abafada pela
política industrial, em vez de qualificada pelo Estado. A justificativa, que
liga esse exemplo ao realismo frio do pensamento social democrata, é que no
mercado sobrevivem as grandes empresas e que, portanto, se os governos alinharem-se
às grandes corporações o benefício social e o marketing político serão
compensados.
Não só por ter
notório reconhecimento mundial Unger merece ser ouvido e lido. Sua obra é
atual, instigante, viva. Ainda que para dela discordar é fundamental que seja
percorrida com a intensidade que sua escrita (e sua fala) encarna(m). Tanto do
ponto de vista filosófico, menos explorado no programa, quanto do político, teórico-social,
jurídico e econômico, suas ideias apresentam chaves extremamente novas com as
quais diagnósticos e prognósticos podem ser feitos. Essa entrevista é um
convite ao seu pensamento.
Abaixo o link
para a entrevista completa:
Um comentário:
Esse texto foi citado pelo mestrando da USP Rafael Zanatta em seu blog, quando registrou suas impressões sobre Mangabeira e a interrogação que representa para o público brasileiro num interessante texto. Acesse por aqui
http://rafazanatta.blogspot.com.br/2012/07/mangabeira-unger-um-teorico.html
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