A ideia de um Foucault marxista, ou da dificuldade desta perspectiva em seu pensamento, tem movido recentes discussões. Em uma reunião de artigos, Marx y Foucault, há uma abordagem, por parte de Thomas Lemke e Stéphane Legrand, de demonstrar uma influência teórica de Marx sobre o seu pensamento. O primeiro em um texto intitulado “Marx sin comillas”: Foucault, la gubernamentalidad y la crítica del neoliberalismo”, em que o autor parte de uma crítica a determinados autores, como Etienne Balibar, que afirma que toda a produtividade filosófica de Foucault se caracteriza por uma luta genuína contra Marx. Para Lemke, afirmar algo desta natureza é não levar em consideração que o pensamento de Foucault, ao longo de todo ele, passa por desdobramentos conceituais. Como o do poder, por exemplo. Lemke, em seu texto, propõe que existe uma grande aproximação entre determinadas ideias foucaultianas e o marxismo. Ele toma como referência de análise a governamentalidade (conjunto de instituições e práticas que se utilizam para conduzir os homens desde a administração até a educação) como sendo uma forma política de controle muito mais ampla, abrigada pelo Estado. Segundo o autor, Foucault em contato com o segundo volume do Capital, de Marx, revê sua posição que antes era de se opor ao discurso jurídico-político para investigar as relações sociais e as consequentes micro-relações de poder nelas presentes. A partir deste desdobramento da ideia de poder Foucault se aproxima de Marx, justamente por tomar como análise de uma nova forma de controle social (biopolítica) a economia e a política, aspectos de referência de que se utiliza Marx para analisar a sociedade e as suas estruturas. Com isto, Foucault passa a ver o Estado não mais como algo negativo, já que nas ideias de Marx é centralizador e único como exercício de poder, mas agora como positivo na medida em que vemos a partir do século XVIII um Estado de governamentalidade garantido pela chamada arte de governar. E é por isso que o marxista Lemke aponta o quanto as análises de Foucault sobre a governamentalidade, em muito nos servem para compreender as contemporâneas formas neoliberais de governo.
Já o texto de Legrand, “O marxismo olvidado de Foucault” comunga com as ideias ditas por Lemke acerca da influência de Marx sobre Foucault. Contudo, Legrand mostra que já em Vigiar e punir, Foucault inicia suas análises do poder levando em consideração a vigilância e o panoptismo, como tecnologias de disciplinarização; trata-se, segundo o autor, de uma forma de ocultar a referência marxista em cujas bases foram elaboradas os principais elementos da análise política de Foucault. Ou seja, que estas concepções foucaultianas inseridas em uma história das instituições carcerárias e considerando a disciplina como tecnologia de controle, foi a maneira que encontrou Foucault para articular uma crítica da economia política e mostrar o quanto, nas sociedades atuais, os indivíduos estão submetidos à exploração dos modos de produção capitalista, que sujeitam os homens quando exigem destes a sua força de trabalho. Daí a sua ideia de ver outras instituições sociais como o exército, os hospitais, as escolas e as fábricas como análogas às prisões, e como sendo os espaços apropriados para um agenciamento dos indivíduos, onde se teria garantida algum tipo de produção por parte deles.
Um comentário:
Profº Vinícius, obrigado pela sua contribuição filosófica. Teu texto revela informações preciosas e nos remete a reflexões profundas entre autores que, comumente, não faríamos relações, porém, autores presentes no nosso complexo cotidiano.
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